sábado, 7 de julho de 2012

Direitos sociais da mulher: trajetória histórica e o papel social feminino


Achei este artigo muito interessante. Este artigo mostra a realidade histórica dos direitos da mulher. 

Vale a pena ler!
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1.      INTRODUÇÃO

            No que tange à história, o princípio de toda a problemática em pauta, a análise da periodização histórica é essencial para compreender o papel desempenhado pela mulher durante séculos. Durante a Idade Média, por exemplo, a fêmea era venerada, devido ao poder gerador da vida, a relação de fecundidade e fertilidade, que eram associadas às divindades femininas e aos rios. Por outro lado, é neste período que se tem relatos de um dos Códigos mais repressivos com as mulheres: o Código de Manu, na Índia, que submetia a mulher à condição de serva do seu marido; além disso, durante a infância, a mulher estaria sob guarda do pai; na juventude, do marido; e na velhice, dos filhos. Na Grécia Antiga e na Roma, assim como no Direito Hinduísta, as leis registravam a supremacia dos homens sobre as mulheres. Com relação à religião, na medida em que o celibato se tornou uma exigência importante da organização hierárquica da igreja, nota-se que a desvalorização da mulher tem por vista a manutenção da ordem eclesiástica; a grande justificativa para tal episódio constitui no fato de que Eva foi a grande pecadora.
            Indubitavelmente, os papeis assumidos pelas mulheres ao longo da história foram inúmeros, mas com o advento da Revolução Industrial – um conjunto de mudanças sociais, tecnológicas, econômicas e científicas – durante o século XVIII, que as mulheres têm o primeiro e mais importante contato com o mundo afora: o mercado de trabalho.  Apesar de não ser a melhor função desempenhada pelas mulheres nas fábricas, devido ao fato de ser um trabalho alienado e exaustivo, que não permite capacidade de liberdade e ascensão, é inquestionável que este foi um marco histórico-social, pois a partir deste acontecimento as reivindicações por melhores condições de trabalho, acesso à cultura e igualdade entre os sexos tomaram grandes proporções – apesar de não serem atingidas. Ainda nesse período, um grande acontecimento marcou afinco a história, o dia 8/3/1857, em Nova Iorque, quando 130 trabalhadoras de uma fábrica de tecidos foram às ruas para protestar por condições dignas de trabalho; fim de uma jornada de exaustiva, que na época era mais de 12 horas em ambientes insalubres. As manifestantes foram fortemente reprimidas pela polícia e trancadas na fábrica, onde então, todas morreram carbonizadas. O dia 8 de março começou a ser comemorado somente em 1910, com o principal objetivo de lembrar as conquistas sociais políticas e econômicas, assim como promover ações para extinguir a discriminação.

2.      MOVIMENTOS FEMINISTAS: DO PRINCÍPIO AOS DIAS ATUAIS

            O feminismo tem origem em 1848, em Nova Iorque, durante a Convenção dos Direitos das Mulheres. O caráter reivindicatório destes movimentos é devido às grandes revoluções, como por exemplo, a Revolução Francesa. O lema desta revolução “Igualdade, Liberdade e Fraternidade”, de acordo com a visão feminista, deveria ser estendido às mulheres, uma vez que somente os cidadãos (homens) eram contemplados com estes. O feminismo é, sobretudo, um movimento político e intelectual que busca desvincular a ideia de diferença entre os sexos, proporcionando assim maior atividade política e social à mulher. Este tipo de reivindicação, ganha força, principalmente após a Revolução Industrial, quando as mulheres ocuparam postos de trabalho e passaram a exigir melhores condições para desenvolver suas atividades, uma vez que eram superexploradas, dentro e fora de casa, mantendo assim uma dupla jornada.
            Durante a década de 60, a filósofa francesa existencialista Simone de Beauvoir publicou uma importante obra norteadora dos movimentos feministas: “O segundo sexo”; a partir de uma reflexão sobre mitos e fatos da situação da mulher, Simone chega à conclusão de que a hierarquização dos sexos é uma questão social e não biológica, como muitos acreditavam ser. “Para descobrir a mulher, não recusaremos certas contribuições da biologia, da psicanálise, do materialismo histórico, mas consideraremos que o corpo, a vida sexual, as técnicas só existem concretamente para o homem na medida em que ele apreende dentro da perspectiva global de sua existência. O valor da força muscular, do falo, da ferramenta só se poderia definir num mundo de valores: é comandado pelo projeto fundamental do existente transcendendo-se para o ser.” [1] Seguindo a mesma perspectiva de Simone, a escritora ucraniana, que viveu, porém, grande parte de sua vida no Brasil, Clarice Lispector, aborda o mesmo assunto que a francesa, em um texto de sua autoria intitulado “Deve a mulher trabalhar?” A partir deste, Lispector problematiza o destino biológico e a inserção da mulher no mercado de trabalho.
            No Brasil, o movimento tomou forma entre o fim do século XVIII e início do XIX, quando as mulheres brasileiras começaram a se organizar e conquistar espaço na área da educação e do trabalho. Durante a década de 30, as mudanças ocorridas foram essencialmente no campo político, como por exemplo, o direito ao voto e a regulamentação do trabalho feminino. Porém, em 1937, durante o Estado Novo - período mais repressivo da Era Vargas - o movimento feminista perde força, somente no final da década seguinte que as mulheres retornam às ruas com a criação da Federação das Mulheres do Brasil. Apesar disso, logo mais inicia um dos períodos mais tensos da história brasileira: a ditadura militar. Com o golpe de 1964, todas as organizações femininas que lutavam por direitos sociais foram fechadas. O retorno dos movimentos foi concomitante à abertura política, em 1975.
            Na atualidade, há um crescente número de protestos feitos ao redor do mundo, que se iniciam por inúmeros motivos: exploração sexual, defesa do aborto, violência doméstica, desigualdades das questões sociais, além das causas políticas. Denominada por “Marcha das Vadias”, o movimento surgiu no Canadá, em 2011, após vários casos de abuso sexual. Interessante observar, que as ativistas as quais lutam por esta causa, vão às ruas com os seios descobertos, ou então, nuas. As opiniões sobre a forma de como o protesto é feito divergem: há os que apoiam, e os que são contra esta ideia. Estas ativistas acreditam que os protestos feitos com vestimentas não chamam a atenção da mídia e do público em geral: é a justificativa para protestar nua. Entretanto, estas mulheres submetem-se a um desrespeito com elas mesmo, uma vez que a atenção que deveria ser dada à causa social defendida é desviada, pois a erotização e a provocação sexual estão em primeiro plano, visto ser uma atitude exibicionista e não de cunho reivindicatório, como deveria ser. Na realidade, a mulher demonstra um pensamento machista, por achar que o seu corpo é a única ferramenta existente para ser ouvida; em suma: colocar corpos à mostra é esconder aquilo que estão lutando.

3.      A MULHER E A CONSTITUIÇÃO: DA CARTA MAGNA IMPERIAL ATÉ A REPUBLICANA DE 1988

             A Constituição Federal – lei máxima do Direito que ocupa o topo da pirâmide normativa – nem sempre concedeu às mulheres a ampla liberdade que lhes é dada atualmente. No âmbito brasileiro, a nossa primeira constituição foi durante o período Imperial, em 1824. O imperador Dom Pedro II criou o Poder Moderador, que estava acima do executivo, legislativo e judiciário; durante esta época, as mulheres e os escravos não eram considerados cidadãos, sendo estes, portanto, excluídos da vida pública e civil brasileira.  Mais tarde, durante o período republicano, é promulgada a segunda constituição brasileira: a de 1891, que vigorou durante toda a República Velha (1889-1930); esta constituição descentralizou o poder, concedendo grande liberdade aos municípios e estados (antigas províncias). O grande avanço foi o direito ao voto, entretanto, as mulheres, analfabetos, religiosos, soldados e mendigos estavam excluídos do processo, podendo votar somente homens maiores de 21 anos. Em 1927, a Constituição Estadual do Rio Grande do Norte concede às mulheres o direito ao voto e a ser votada; sendo que em âmbito federal, isto somente ocorreu em 1932, com o presidente Getúlio Vargas.
            Em 1934, foi publicada pela Assembleia Nacional Constituinte, uma nova Constituição. Apesar de permanecer somente 3 anos em vigor, esta Constituição marcou a história brasileira pela introdução de uma nova ordem econômica e social no país, as quais refletem as mudanças sociais ocorridas na época. Esta nova Carta Magna trazia direitos inéditos aos trabalhadores: salário mínimo, férias remuneradas, proibição do trabalho infantil, jornada de 8 horas diárias, descanso semanal, além de criar a Justiça do Trabalho. Ela ainda trazia o voto secreto e o sufrágio feminino, já previsto no Código Eleitoral, de 1932. Entretanto, infelizmente, a conquista do voto  não significou uma mudança substancial nos valores sociais então vigentes, uma vez que as mulheres da época continuaram submetidas a uma estrutura patriarcal conservadora e a um modelo de cidadania que privilegiava a imagem pública como espaço masculino. Durante o Estado Novo – período de regime fascista, que durou até o final da Segunda Guerra mundial – o presidente outorgou uma constituição, popularmente chamada de Polaca, por se inspirar na Constituição extremamente autoritária da Polônia. A principal característica dessa Carta Magna era o caráter essencialmente centralizador, ou seja, os poderes estavam concentrados nas mãos do executivo. Nesta época, nenhum avanço com relação aos direitos sociais para ambos os sexos podem ser observados, devido ao caráter totalitário e autoritário do texto redigido.
            Com o presidente Eurico Gaspar Dutra, as liberdades que haviam então sido consagradas com a Constituição de 1934, mas foram retiradas em 1937, voltaram a vigorar no território brasileiro; a igualdade de todos os cidadãos perante a lei era a base da Constituição. Com relação às mulheres, estas se empenharem em lutar pela modificação do Código Civil de 1916, o resultado, entretanto, veio somente em 1962 com o Estatuto da Mulher Casada. Por sua vez, em 1964, os militares assumiram o poder através de um golpe de estado, dando início a ditadura militar. Já nos primeiros anos de ditadura, foram decretados inúmeros Atos Institucionais que concediam inúmeros poderes ao presidente, além de suspender as garantias constitucionais dos cidadãos. Em 1967, foi promulgada uma nova Constituição que institucionalizou o poder militar, concedendo ao executivo poder soberano, sendo então considerada o órgão máximo da antidemocracia. Durante o período repressivo, a Europa vivia o auge do movimento feminista, mas no Brasil, todas as organizações femininas que lutavam por seus direitos sociais foram fechadas. Algumas mulheres apenas se organizavam para militar por causas políticas, exigindo o fim da ditadura militar.
            Foi durante o governo de José Sarney (1986-1989) que foi promulgada a nossa atual Carta Magna: a Constituição de 1988. Esta tem como principal objetivo assegurar as garantias constitucionais e fundamentais aos cidadãos, permitindo a participação do poder judiciário caso ocorra alguma ameaça a lesão de direitos. Em relação às constituições anteriores, a atual demonstra um avanço significativo, como por exemplo, quando concede direito a voto para analfabetos; direito a greve; o racismo é considerado crime inafiançável; fim da censura; seguro desemprego; liberdade sindical, dentre outros progressos. O princípio norteador do texto está expresso no artigo 5°, o qual trata dos Direitos e Garantias Fundamentais, que iguala os sexos, assegurando então, o fim da discriminação feminina, de acordo com o trecho: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (...)” Apesar de isso estar expresso de maneira clara e concisa, sabe-se que na realidade a cultura da nossa sociedade extremamente machista não permite que as mulheres sejam equiparadas aos homens: o preconceito, lamentavelmente, está intrínseco no ser humano.

4.      A EVOLUÇÃO JURÍDICA NO ÂMBITO CIVIL, TRABALHISTA E PENAL
 
            O primeiro marco para romper com a soberania masculina foi em 1962, através do Estatuto da Mulher Casada, que concedeu plena capacidade à mulher como uma colaboradora da vida conjugal. Cabe ressaltar que as mudanças no Código Civil não foram de maneira abrupta; as mulheres conquistaram seus direitos de maneira vagarosa. As principais modificações no Código Civil são no que diz respeito ao casamento. Ele determina que mulheres e homens são iguais para determinar e resolver todas as questões familiares e que o sustento da família cabe ao casal, e não apenas ao homem. Além disso, o homem pode acrescentar o sobrenome da mulher, o que antes não era permitido. Em 1977, introduziu-se a Lei do Divórcio dando aos cônjuges a oportunidade de por fim ao casamento e constituir nova família.
            Com relação ao trabalho, após a Segunda Guerra Mundial - quando as fábricas necessitaram de mulheres, já que os homens estavam nos campos de batalha - houve uma crescente manifestação para a inserção da mulher no mercado de trabalho. No Brasil, a principal contribuição foi a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) que concedeu às mulheres amplos direitos, como por exemplo, a proteção à maternidade, garantia de emprego à mulher grávida, licença gestante/maternidade, e alguns benefícios para a mulher trabalhadora portadora do vírus HIV. Direitos estes que foram conquistados através de muita luta, pois desde a infância, está enraizado na nossa cultura que a mulher deve dedicar-se ao lar, enquanto o homem vai às ruas. A primeira reivindicação de qualquer mulher que se deseja tornar independente e romper os laços patriarcais, é sem dúvidas, a do trabalho; sem trabalho, e sem possibilidade de amadurecimento, a mulher reduz-se à função reprodutora e de “mulher do lar”. Como já bem dizia Simone de Beauvoir: “É pelo trabalho que a mulher vem diminuindo a distância que a separava do homem, somente o trabalho poderá garantir-lhe uma independência concreta.”.
            Por sua vez, no âmbito criminal, em 2006 o Código penal sofreu uma indispensável alteração: a Lei Maria da Penha, que tem por objetivo proteger as mulheres contra a violência doméstica. Anteriormente, os réus eram obrigados a pagarem cesta básica ou prestarem serviços à comunidade, o que denotava uma banalização da violência: o agressor ficava impune, e a agredida tinha medo e desinteresse em denunciá-lo, já prevendo a punição leve. Por isso, em homenagem à farmacêutica bioquímica que ficou paraplégica por causa de um tiro nas costas dado por seu marido, e que tomou a iniciativa de denunciá-lo após várias tentativas de homicídio, que a lei possui este nome. A lei Maria da Penha alterou o Código Penal Brasileiro e possibilitou que agressores de mulheres no âmbito doméstico ou familiar sejam presos em flagrante ou tenham sua prisão preventiva decretada, caso ocorra riscos de a mulher ser agredida novamente. A norma também pronuncia que não há mais a opção de os agressores cumprirem a pena somente com cestas básicas ou multas. A pena é de três meses a três anos de prisão e pode ser aumentada se a violência for cometida contra mulheres com deficiência. Além disso, a vítima é informada sobre todo o processo que envolve o agressor, especialmente sobre sua prisão e soltura.


5.      CONSIDERAÇÕES FINAIS

            Sendo assim, ao analisar a trajetória histórica da mulher, nota-se que a ocupação de espaço significativo na sociedade denota grande ascensão social em que as mulheres estão submetidas. A mulher já mostrou competência para atuar em diversas áreas, através da ocupação de cargos importantes em seus mais diversos campos; entretanto, infelizmente, a concepção de que o dever dela consiste em cuidar do lar, ainda está enraizado na sociedade. Uma mudança de cultura, desde o princípio, em seus valores substanciais demonstra a solução mais plausível para a equiparação total dos sexos. Por sua vez, o Direito, instrumento de regulação social, contempla e protege as mulheres; a base legal é extremamente forte, mas a sociedade não a põe em prática de maneira efetiva; é um retrocesso aceitar o fato de que ainda existe desigualdade, principalmente salarial, entre homens e mulheres; o sexo não deve ser um fator de segregação social. Por fim, o que se pretende por igualdade é somente respeito mútuo, onde a dignidade humana seja garantida para o estabelecimento de uma sociedade justa.

6.      REFERÊNCIAS

            BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo: fatos e mitos. São Paulo: Círculo do Livro S.A. 325 p.
            FIRESTONE, Shulamith. A dialética do sexo: um manifesto da revolução feminista. Rio de Janeiro: Editoral Labor do Brasil, 1976. 277 p.        
             STUDART, Heloneida. Mulher objeto de cama e mesa. 18ª edição. Rio de Janeiro: Editora Vozes Ltda. 1974. 53 p.
            LISBOA, Maria Regina Azevedo; MALUF, Sônia Weidner. Gênero, Cultura e Poder. Florianópolis: Editora Mulheres, 2004. 160 p.
FOCAULT, Michel.  História da sexualidade, 3: o cuidado de si. Rio de Janeiro:  Edições Graal, 1985.

            Disponível em: <http://www.ufrgs.br/nucleomulher/direitos.php> Acesso em: 25/06/2012

            Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm> Acesso em: 25/06/2012
            Disponível em: < http://www.conjur.com.br/> Acesso em: 26/06/2012
            Disponível em: < http://jus.com.br/revista/texto/4642/a-entrada-em-vigor-do-novo-codigo-civil> Acesso em: 27/06/2012

Fonte: http://jusvi.com/artigos/46331